A possibilidade de demissão de um empregado com doença crônica é uma questão que gera muitas dúvidas e preocupações, tanto para trabalhadores quanto para empregadores. Embora a legislação brasileira permita a dispensa sem justa causa, há limites para que essa decisão não viole direitos fundamentais do empregado.
O principal ponto de atenção é a proteção contra a dispensa discriminatória, prevista na Súmula 443 do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que presume como ilegal a demissão de trabalhadores com doenças graves que possam gerar estigma ou preconceito, como câncer, HIV e esclerose múltipla. Além disso, a Lei nº 9.029/1995 proíbe práticas discriminatórias no ambiente de trabalho.
Neste artigo, vou explicar em quais situações um empregado com doença crônica pode ser demitido, quais são as proteções garantidas pela legislação trabalhista e quais medidas podem ser tomadas caso a dispensa seja indevida. Conhecer esses direitos é essencial para evitar injustiças e garantir que a legislação seja aplicada corretamente.
Doenças que podem impedir a demissão
A legislação trabalhista brasileira protege empregados que sofrem com determinadas doenças graves, impedindo sua demissão quando há indícios de discriminação.
A Súmula 443 do TST presume como discriminatória a dispensa de trabalhadores com doenças graves que possam gerar estigma ou preconceito, garantindo a esses empregados o direito à reintegração ou indenização.
Embora não haja uma lista fechada, algumas doenças crônicas são frequentemente reconhecidas pela Justiça do Trabalho como motivo para proteção contra a dispensa arbitrária:
- HIV/Aids: doença crônica que exige acompanhamento contínuo e pode estar associada a preconceitos e discriminação no ambiente de trabalho.
- Câncer (neoplasia maligna): muitas vezes requer tratamentos prolongados, como quimioterapia e radioterapia, afetando a capacidade no trabalho.
- Diabetes Mellitus grave: especialmente quando há necessidade de insulina e monitoramento constante, podendo gerar dificuldades na rotina de trabalho.
- Doenças psiquiátricas graves: como esquizofrenia, transtorno bipolar e depressão maior.
- Esclerose múltipla: doença degenerativa do sistema nervoso central, que pode reduzir progressivamente a capacidade de trabalho.
- Cardiopatias graves: problemas cardíacos avançados que limitam a capacidade física do empregado e exigem acompanhamento médico contínuo.
- Doença renal crônica: condição que pode exigir diálise ou até mesmo transplante, impactando diretamente a rotina de trabalho.
- Dependência química e alcoolismo: reconhecidos como doenças crônicas pela OMS, essas condições podem exigir tratamento contínuo.
Quando o empregado com doença crônica pode ser demitido?
Ter uma doença crônica não garante, por si só, estabilidade no emprego. A legislação trabalhista não impede a demissão de um empregado nessa condição, desde que a dispensa respeite certos critérios legais.
O que é proibido é a demissão discriminatória, ou seja, quando a rescisão ocorre por causa da doença, configurando um ato de preconceito. A demissão pode ocorrer legalmente nos seguintes casos:
- Se a doença não for ocupacional: ou seja, se não tiver sido causada ou agravada pelo ambiente ou pelas condições de trabalho. Doenças ocupacionais garantem estabilidade de 12 meses após o retorno do afastamento.
- Se o trabalhador não estiver afastado pelo INSS: durante o período de afastamento previdenciário, o contrato de trabalho fica suspenso, impedindo a demissão.
- Se a dispensa não for discriminatória: a demissão é permitida, desde que seja justificada por fatores alheios à doença e não configure preconceito ou perseguição contra o trabalhador.
A demissão pode ser:
- Sem justa causa: quando o empregador decide rescindir o contrato sem necessidade de justificativa específica, desde que cumpra as obrigações trabalhistas, como aviso prévio e verbas rescisórias.
- Por justa causa: quando o trabalhador comete falta grave prevista na legislação, como atos de indisciplina ou abandono de emprego.
Caso um trabalhador com doença crônica suspeite que foi demitido de forma irregular, ele pode buscar a Justiça do Trabalho para reverter a dispensa ou obter indenização.
Demissão durante afastamento pelo INSS
Quando um empregado está afastado pelo INSS e recebe auxílio-doença, seu contrato de trabalho fica suspenso, ou seja, ele não pode ser demitido durante esse período. Isso ocorre porque a legislação trabalhista protege o trabalhador enquanto ele está sob tratamento médico, garantindo sua recuperação sem o risco de perder o emprego.
Além disso, se a doença que motivou o afastamento for ocupacional (ou seja, adquirida ou agravada pelo trabalho), o empregado tem direito à estabilidade de 12 meses após o retorno. Isso significa que, ao voltar ao trabalho, ele não pode ser dispensado sem justa causa durante esse período, conforme previsto na legislação previdenciária.
Se um empregador demitir um funcionário durante o afastamento pelo INSS de maneira ilegal, as consequências podem inclui diferentes reparações ao trabalhador. Conforme a Lei nº 9.029/1995, além da indenização por danos morais, o empregado pode optar entre a reintegração ao emprego ou a indenização substitutiva, cabendo a ele essa escolha.
Caso opte pela reintegração, a Justiça do Trabalho pode determinar o retorno ao cargo, anulando a demissão e garantindo o ressarcimento integral de todo o período de afastamento, com pagamento das remunerações devidas, corrigidas monetariamente e acrescidas de juros legais.
Se preferir a indenização substitutiva, o trabalhador tem direito à percepção em dobro da remuneração correspondente ao período de afastamento, também corrigida monetariamente e acrescida de juros legais.
Nessa situação, uma vez pleiteada a indenização, o Tribunal não pode determinar a reintegração, garantindo o direito de escolha do empregado.
O que caracteriza dispensa discriminatória?
A dispensa discriminatória ocorre quando o empregador demite um funcionário com base em critérios que ferem sua dignidade e igualdade de oportunidades no trabalho, como sua condição de saúde.
A Justiça do Trabalho exige que a empresa comprove que a dispensa ocorreu por motivos legítimos e não relacionados à condição do trabalhador.
A Lei nº 9.029/1995 reforça essa proteção ao proibir qualquer prática discriminatória na relação de emprego, incluindo demissões baseadas em doença, deficiência ou qualquer outro fator que possa ser considerado preconceituoso.
O que fazer em caso de demissão durante doença?
Se um trabalhador for demitido enquanto enfrenta uma doença, é essencial tomar algumas medidas para proteger seus direitos. Veja os principais passos:
1. Reunir documentação médica
- Guarde atestados, exames e laudos médicos que comprovem sua condição de saúde e o impacto no trabalho.
- Se a doença for ocupacional, inclua documentos que comprovem o nexo com as atividades do trabalho.
2. Buscar um advogado trabalhista
- Um especialista pode analisar se a demissão foi ilegal e indicar a melhor estratégia para reverter a situação.
- O advogado pode solicitar a reintegração ao emprego com pagamento dos salários do período de afastamento ou a indenização substitutiva em dobro, além de indenização por danos morais e materiais, independentemente da escolha do trabalhador.
3. Acionar o sindicato ou o Ministério Público do Trabalho (MPT)
- O sindicato da categoria pode intermediar a negociação com a empresa e fornecer suporte jurídico.
- O MPT pode investigar a conduta da empresa, principalmente se houver indícios de dispensa discriminatória ou irregularidades trabalhistas.
Direitos do trabalhador em caso de demissão indevida
Se a demissão de um empregado doente for considerada irregular, a Justiça do Trabalho pode determinar diversas medidas para reparar o dano sofrido. O trabalhador tem direito a:
- Escolher entre:
- Reintegração ao emprego, com pagamento dos salários retroativos do período de afastamento.
- Indenização substitutiva, correspondente ao pagamento em dobro da remuneração do período de afastamento.
- Indenização por danos morais e materiais, independentemente da escolha entre reintegração ou indenização substitutiva.
- Direitos previdenciários, como a aposentadoria por invalidez junto ao INSS, caso a doença cause incapacidade total e permanente.
A importância de agir diante de uma demissão indevida
Conhecer os direitos trabalhistas é essencial para que o empregado com doença crônica não seja prejudicado por uma demissão indevida.
Caso suspeite que sua dispensa ocorreu de forma ilegal ou discriminatória, é fundamental buscar orientação jurídica para avaliar a situação e tomar as medidas cabíveis. Com o devido suporte, é possível reverter injustiças e garantir os direitos previstos na legislação.