Você acorda exausto, sente que o trabalho consome toda sua energia e até tarefas simples parecem impossíveis? Esses podem ser sinais da síndrome de burnout, um esgotamento profissional reconhecido como doença ocupacional desde 1999.
Essa doença representa um grave problema de saúde pública que afeta milhares de trabalhadores. Diferentemente do que muitos pensam, não se trata apenas de cansaço ou estresse passageiro, mas de um esgotamento profissional crônico que evolui progressivamente, comprometendo a saúde física e mental do indivíduo.
Neste artigo, vou explicar como solicitar afastamento por burnout, quanto tempo dura o benefício, como comprovar o diagnóstico e em quais casos é possível até mesmo buscar uma aposentadoria por burnout.
O que é a Síndrome de Burnout?
O burnout é caracterizado por três dimensões principais: exaustão emocional, despersonalização (cinismo) e redução da eficácia profissional. Seus sintomas incluem cansaço extremo, dores de cabeça frequentes, fadiga, alterações na pressão arterial, problemas com o sono, perda de produtividade e irritabilidade constante.
Este quadro não surge repentinamente. O Burnout é um adoecimento crônico, que vai evoluindo por meses, anos ou até décadas de estresse acumulado, ele não chega e nem vai embora da noite para o dia. Trata-se de um processo gradual de deterioração da saúde mental e física do trabalhador, frequentemente associado a ambientes de trabalho tóxicos.
O chamado “Ciclo do Burnout” se inicia com dedicação intensa ao trabalho, passa por sobrecarga de tarefas, forte cobrança, irritabilidade, isolamento social, até chegar à depressão e completo esgotamento físico e mental.
Entendendo o Burnout como doença ocupacional
Em 2022, a Organização Mundial da Saúde (OMS) reconheceu oficialmente o burnout como doença ocupacional na CID-11. No Brasil, porém, este reconhecimento existe desde 1999, quando o Ministério da Saúde incluiu a síndrome na lista de doenças ocupacionais através da Portaria 1.339.
Mais recentemente, em 2023, o Ministério da Saúde atualizou esta lista através da Portaria GM/MS 1.999/2023, reforçando o burnout como doença ocupacional e incluindo expressamente diversos riscos psicossociais relacionados a ela.
Paralelamente, a NR-1 foi atualizada para incluir obrigações específicas para as empresas quanto à prevenção do adoecimento mental, citando pela primeira vez de maneira expressa os riscos psicossociais.
O Brasil ocupa o 2º lugar no mundo em casos de burnout, segundo dados da International Stress Management Association (ISMA). A pesquisa revela que 32% dos profissionais brasileiros sofrem com sintomas graves, como insônia, crises de ansiedade e perda de produtividade.
É possível se afastar do trabalho por burnout?
Sim! O afastamento por síndrome de burnout é um direito garantido por lei desde que a síndrome foi reconhecida como doença ocupacional. O tempo de afastamento por burnout funciona da seguinte forma:
Afastamento inicial (até 15 dias):
- Qualquer médico pode emitir o atestado, não apenas psiquiatras
- O documento deve conter o CID Z73.0 (código do burnout na CID-10) ou QD85 (CID-11)
- Durante este período inicial, a empresa paga o salário do funcionário
Afastamento prolongado (acima de 15 dias):
Você precisa solicitar o benefício por incapacidade do INSS. Após os primeiros 15 dias, o afastamento passa a ser custeado pela Previdência Social, mas exige perícia médica para comprovar a necessidade do afastamento.
Por exemplo: Se você ficar 30 dias afastado, os primeiros 15 são pagos pelo empregador e os outros 15 pelo INSS.
Importante:
- O diagnóstico deve relacionar o burnout às suas condições de trabalho (excesso de tarefas, assédio, entre outros).
- A empresa não pode negar o afastamento inicial, isso configuraria descumprimento da CLT.
- Não deixe de comunicar formalmente o RH e guarde cópias de todos os documentos.
Quais são os direitos de quem é diagnosticado com burnout?
Para além do afastamento imediato, explicado anteriormente, o trabalhador com o diagnóstico confirmado de burnout tem outros direitos fundamentais:
Auxílio por Incapacidade Temporária (antigo auxílio-doença)
- Pode ser concedido como B91 (acidentário) quando comprovada relação com o trabalho.
- O cálculo do auxílio-doença B91 é feito com base no menor valor entre 91% do salário de benefício (média de todas as contribuições desde 07/1994) e a média das 12 últimas contribuições.
- Garante estabilidade de 12 meses após o retorno ao trabalho.
- Durante o afastamento, a empresa deve continuar depositando o FGTS.
Aposentadoria por Invalidez (casos graves)
- Concedida em situações onde há incapacidade permanente sem perspectiva de recuperação.
- Exige comprovação de que o trabalhador está totalmente incapacitado para suas atividades habituais e, tampouco, pode ser reabilitado para outra função.
- O valor corresponde a 100% da média dos salários de contribuição.
Esses direitos só valem se o diagnóstico relacionar o burnout diretamente às condições de trabalho.
Tempo de afastamento e reabilitação
Não existe um tempo máximo predefinido para afastamento por burnout. A duração dependerá da gravidade do caso, da resposta ao tratamento e da avaliação do perito do INSS. Em média, os afastamentos duram entre 6 e 12 meses, podendo ser prorrogados conforme necessidade médica.
É fundamental que o trabalhador solicite a prorrogação do benefício nos últimos 15 dias antes do término do prazo estipulado na carta de concessão. Caso contrário, será necessário iniciar um novo processo de solicitação.
Como provar a síndrome de burnout no INSS?
Para garantir o benefício, é essencial comprovar o vínculo entre a síndrome e as condições de trabalho. Seguir o passo a passo abaixo é fundamental para alcançar seus direitos:
1. Documentação médica
- Atestados e laudos médicos com CID Z73.0 (código do burnout na CID-10)ou QD85 (CID-11)
- Relatórios detalhando sintomas: insônia, crises de ansiedade, exaustão extrema.
2. Provas do ambiente de trabalho
- Registros de horas extras, e-mails após o expediente ou mensagens cobrando metas excessivas.
- Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT): obrigatória para doenças ocupacionais, a empresa deve emitir a CAT, reconhecendo a natureza ocupacional da doença. Caso a empresa se recuse, o trabalhador pode solicitar ao sindicato ou ao CEREST da região. Em último caso, o próprio trabalhador pode emiti-la.
3. Perícia do INSS
- Leve todos os documentos e descreva como os sintomas afetam suas atividades (ex: “não consigo me concentrar por mais de 10 minutos”).
- Se o perito negar o benefício, é recomendável buscar um auxílio de um advogado especializado.
O papel das organizações na prevenção
A atualização da NR-1 estabelece que as empresas devem implementar medidas preventivas contra riscos psicossociais, incluindo:
- Identificação e gestão de fatores de risco no ambiente de trabalho
- Implementação de políticas contra assédio moral e sexual
- Avaliações regulares do ambiente psicossocial
- Treinamento e conscientização sobre saúde mental
O burnout não é um problema apenas do indivíduo, e nem 100% da responsabilidade recai sobre as organizações. A síndrome é um fenômeno sistêmico e, que, demanda ações nos planos individuais, coletivos, sociais e judiciais.
Alternativas em casos graves
Para trabalhadores que desenvolveram burnout e não conseguem retornar ao mesmo ambiente que causou o adoecimento, existe a possibilidade de solicitar uma rescisão indireta do contrato de trabalho.
Este procedimento é equivalente a uma “justa causa aplicada à empresa”, permitindo que o funcionário se desligue recebendo todos os seus direitos trabalhistas.
Não ignore os sinais: passos para garantir seus direitos
Se você reconhece sintomas de burnout, agir rápido é fundamental. O primeiro passo é procurar um profissional para obter um diagnóstico oficial, só assim é possível solicitar o afastamento.
Documente todas as situações de estresse no trabalho: salve e-mails com cobranças abusivas, registre horas extras e até conversas informais que demonstrem pressão excessiva.
Também é importante fazer uma denúncia formal, se possível, pelo canal de compliance da empresa ou outro meio institucional, e guardar uma cópia da mensagem enviada ou do protocolo gerado.
Comunique formalmente o RH sobre sua condição, preferencialmente por e-mail, e exija o cumprimento dos prazos legais.
Se o INSS negar seu benefício, não desista: um advogado trabalhista pode ajudá-lo a entrar na Justiça, onde as chances de sucesso são maiores, principalmente com um laudo médico detalhado.
Lembre-se: o burnout não é fraqueza, e sim uma doença com direitos assegurados. Pessoas não adoecem em ambientes saudáveis.